O interesse pela cirurgia de bichectomia é cada vez mais comum, já que o procedimento se tornou uma febre entre famosos e, consequentemente, influenciou grande número de pessoas que desejam um rosto mais fino.
Cirurgiões-dentistas que trabalham com harmonização orofacial devem manter-se atualizados a respeito do assunto, justamente para evitar a banalização do procedimento e, claro, proporcionar segurança para o paciente. Por isso, neste conteúdo, separamos informações valiosas que devem ser consideradas pelo profissional. Boa leitura!
O que é a cirurgia de bichectomia?
A bichectomia consiste na retirada de um tecido gorduroso, localizado nas bochechas, entre os músculos masseter e bucinador, conhecido como bolas de Bichat. O tecido ganhou esse nome por ter sido descoberto pelo anatomista e fisiologista francês Marie François Xavier Bichat, pioneiro nos estudos do corpo humano, conhecido pelas suas contribuições relativas à patologia dos tecidos.
Acredita-se que as bolas de Bichat auxiliam na sucção dos bebês durante a amamentação, fornecendo, também, proteção dos ramos bucais do nervo facial, porém perdem sua função na fase adulta. Em adultos, esse tecido gorduroso não possui função estrutural, funcional ou de sustentação.
Bichectomia: dentistas podem fazer o procedimento?
Uma dúvida comum é se dentista pode fazer bichectomia, afinal, já faz algum tempo que a harmonização orofacial realizada por cirurgiões-dentistas é um assunto que levanta alguns dilemas com a classe médica. Desde 2019, o Conselho Federal de Odontologia reconhece a área como uma especialidade odontológica, por meio da resolução CFO-198.
No documento, é colocado que o dentista tem permissão para realizar “técnica cirúrgica de remoção do corpo adiposo de Bichat (técnica de bichectomia)”. Entretanto, é importante ter o título de especialização em harmonização orofacial por meio de cursos com carga horária mínima de 500 horas divididas assim: no mínimo, 400 horas na área de concentração, 50 horas na área conexa e 50 horas para disciplinas obrigatórias.
Outra exigência é que, na área de concentração, deverão constar, no mínimo, disciplinas de preenchedores faciais e toxina botulínica, fios orofaciais, lipoplastia facial, agregados leuco-plaquetários autólogos, mesoterapia e indutores percutâneos de colágeno fototerapia facial.
Já na área de conexão deve haver, no mínimo, disciplinas de anatomia de cabeça e pescoço, histofisiologia, anatomia da pele, farmacologia e farmacoterapia.
Indicações e contraindicações da bichectomia
Como em qualquer procedimento estético, existem contraindicações e riscos, e o paciente deve passar por uma avaliação criteriosa realizada por um profissional capacitado, que vai analisar a indicação do procedimento.
Somente o cirurgião-dentista habilitado poderá avaliar se o volume de bochechas que incomodam o paciente se dá devido às bolas de Bichat, ou se é resultado de outro motivo, como hipertrofia do masseter, depósito de gordura ou mesmo devido ao padrão fácil braquicefálico. Nesses casos, indicamos o procedimento ideal para contornar a queixa do paciente, evitando, assim, frustrações com o resultado.
Os casos indicados são:
- Pessoas insatisfeitas com o volume das bochechas;
- Bochechas clinicamente com volume aumentado;
- Fechamento de defeitos intrabucais, como a fístula buco-sinusal usada para enxertos;
- Pacientes com o hábito de morder internamente as bochechas, causando hiperplasias, aftas e sangramento.
No caso da indicação estética, é importante que o profissional saiba avaliar o formato do rosto do paciente e que preveja o resultado estético da cirurgia. Por exemplo, em pessoas com a face em formato triangular ou alongado/ovalado, a cirurgia potencializará esse formato, exigindo uma avaliação sobre o provável resultado e se ficará esteticamente agradável.
Em contrapartida, em rostos arredondados ou quadrados, a bichectomia criará um contorno para estes formatos de rosto, que é, normalmente, o objetivo dos pacientes em relação à estética do rosto.
Sobre as contraindicações, é importante seguir as mesmas para qualquer tipo de cirurgia, que são:
- Pacientes em processo de radioterapia e/ou quimioterapia;
- Pessoas com infecções locais;
- Cardiopatias severas;
- Imunossupressão;
- Coagulopatia;
- Nefropatia;
- Trismo mandibular;
- Gestantes;
- Menores de idade;
- Problemas renais;
- Infecções sistêmicas;
Técnicas cirúrgicas para retirada da gordura de Bichat
A bichectomia é considerada um procedimento cirúrgico relativamente simples com duração média de 40 minutos. Mas atenção: é fundamental ter cuidado com o excesso de autoconfiança e lembrar-se que, como qualquer intervenção, pode haver riscos.
É crucial que o cirurgião-dentista seja bem capacitado, afinal esta é uma região de grande quantidade de vasos sanguíneos e que tem conexão com toda a face, além de que, em alguns casos, pode ser necessário agir quando há complicações.
Iniciamos a cirurgia com anestesia local, aplicada na parede interna das bochechas, e, então, criamos uma pequena incisão de 1 a 2 centímetros e, com uma tesoura fina (metzembaum) ou pinça hemostática, divulsionamos as fibras — a tesoura entra fechada e, em contato com o músculo bucinador, abrimos até encontrar o corpo de Bichat.
Esse tecido é consideravelmente sensível e é importante preservar sua estrutura. Portanto, com uma pinça dietrich longa e fina, pinçamos e puxamos suavemente fazendo movimentos leves e circulares. Na grande maioria dos casos, as bolas de Bichat não são completamente retiradas.
Todo o complexo adiposo pode ser dividido em três partes: a extensão bucal, a extensão supero medial e a extensão temporal. O efeito blush que buscamos é ocasionado pela extensão bucal, portanto é esta parte que retiramos. É possível planejar remover quantidades diferentes entre as duas bochechas, visando corrigir assimetria, porém essa decisão é tomada em casos de assimetria considerável, mas este equilíbrio ainda é pouco previsível.
O procedimento deve iniciar com o cirurgião e assistente bem posicionados, de forma que tenham excelente visão da área a ser operada. No primeiro momento, de preparação, o paciente deve estar em decúbito dorsal com a cabeça elevada a 45 graus, para que a bola de Bichat fique mais próxima da incisão, como explica o artigo “A bichectomia como procedimento cirúrgico estético-funcional”.
Complicações relacionadas à cirurgia para diminuir bochecha
Complicações podem acontecer, e o cirurgião-dentista deve estar pronto para lidar com elas. As adversidades mais comuns são hemorragias e infecções locais, mas, também, é possível que ocorram danos aos ductos salivares ou aos nervos da face, gerando paralisia ou sensação de dormência em parte do rosto. Na grande maioria das vezes, essas adversidades são tratáveis com laserterapia e terapia medicamentosa para tal.
Grande parte das complicações tem relação com o fato do cirurgião-dentista abordar as estruturas delicadas da região de forma inadequada, seja por técnicas incorretas ou excesso de manipulação.
Outra situação que cirurgiões-dentistas podem enfrentar é a formação de seroma, que é o acúmulo de líquido que surge em espaços vazios entre os tecidos. Não é o mesmo que pus, sangue ou infecção, mas cria inchaço e leva um longo período (de duas a três semanas) até voltar ao normal.
É necessário ficar atento e acompanhar o seroma: quando ele demora tempo superior ao citado ou é muito grande, pode haver contaminação. Nesses casos, é importante fazer o uso de curativos compressivos para diminuir o espaço entre os tecidos e auxiliar na drenagem.
A complicação mais preocupante é o abscesso, que vem da infecção oportunista. Nesse caso, o uso de antibiótico é indispensável, mas atenção: é importante conhecer a bactéria que está causando a situação antes de prescrever.
Pós-operatório
O pós-operatório é muito semelhante à extração de um terceiro molar e exige cuidados por até uma semana. É possível que o paciente sinta dor local e apresente inchaço e hematoma. Esses sintomas são consideravelmente diminuídos quando ele obedece às indicações de repouso, não participando de atividades físicas, mantendo, também, uma alimentação predominantemente líquida, fria e pastosa, e tomando corretamente a medicação indicada, que normalmente são anti-inflamatórios, antibióticos e analgésicos.
Faz-se o uso de corticoides com a dosagem dobrada uma hora antes do procedimento e laserterapia logo após a cirurgia na tentativa de trazer um pós-operatório mais previsível.
A indicação da faixa compressiva é uma excelente aliada, pois proporciona mais conforto ao paciente, além de auxiliar com os sintomas do pós-operatório.
O resultado final da bichectomia se dá em três meses, mas, já na segunda semana, é possível notar diminuição considerável do volume das bochechas, com realce nas mandíbulas, além de cessar quase imediatamente os traumas internos causados por mordidas na região interna.
O procedimento é irreversível – uma vez realizado, não é possível recolocar o mesmo material gorduroso nas bochechas ou mesmo que cresçam de novo. Mesmo havendo ganho de peso, o mesmo material gorduroso não volta a se acumular no local. Por conta disso é extremamente importante ter sido feita uma avaliação correta e criteriosa, expondo os riscos e possíveis resultados por meio de maquiagem ou editores de fotos.
O que podemos concluir é que, com a combinação de avaliação criteriosa, profissionais habilitados, pacientes corretamente indicados e técnicas comprovadamente efetivas e uma boa dose de bom senso, é possível conseguir um resultado de sucesso na cirurgia de bichectomia, sem complicações ou ocorrências inesperadas.
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Referências bibliográficas
NEVES, Agatha Notari das; SILVA, Paula Suellen Pedrosa da. Bichectomia: indicações e contra indicações. Monografia (graduação) — Universidade de Taubaté, Departamento de Odontologia, 2019.
ALMEIDA A., Alvary P. A Bichectomia como procedimento Cirúrgico Estético-Funcional: Um estudo crítico: Case report. J Business Techn. 2018;7(1):3-14
Aula “Complicações em cirurgias de bichectomia”, Instituto Valesco. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=qKg9TiU2WL8