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O Instituto Nacional de Câncer (Inca) estima que, até 2022, 625 mil novos casos de câncer serão diagnosticados no Brasil. A doença, além de desafiar médicos e enfermeiros, instiga os profissionais de odontologia, que devem estar preparados para atender pacientes oncológicos e a trabalhar de forma multidisciplinar para diminuir os efeitos colaterais de tratamentos.
Para isso, o cirurgião-dentista deve entender as características dos tratamentos oncológicos, quais as principais doenças bucais que surgem como consequência dos diferentes tipos de terapia e como atuar em cada fase do atendimento de forma humanizada e alinhada às necessidades do paciente.
Continue a leitura e entenda mais como atuar com pacientes oncológicos na odontologia. Boa leitura!
Ao receber um paciente oncológico no consultório, o primeiro passo é preencher a anamnese, documento fundamental para que cirurgiões-dentistas planejem e estudem tratamentos seguros e possam fazer diagnósticos mais precisos. É nesse momento que você irá receber todo o contexto da doença e entender em qual etapa o paciente está.
Se com os pacientes saudáveis a anamnese já deve ser feita cuidadosamente, nos casos de câncer o cuidado deve ser redobrado, considerando o estado emocional, físico e psicológico, além das especificidades da doença.
Em seguida, é preciso pensar no protocolo de atendimento, que pode ser dividido em três etapas, que são a fase prévia ao tratamento oncológico, durante e posterior.
O tratamento odontológico, idealmente, deve anteceder o oncológico. De acordo com informações publicadas em um artigo na revista Health Sci Inst., os procedimentos prévios devem ser constituídos por alguns procedimentos:
O artigo “Protocolo de atendimento odontológico a pacientes oncológicos pediátricos” explica que o tratamento antineoplásico acompanhado de complicações bucais pode gerar dor e desconforto extremos, assim como nutrição deficiente, limitações de dosagens de antineoplásicos e aumento da hospitalização. Em alguns quadros, pode ocorrer septicemia, que gera riscos à vida do paciente.
Portanto, o profissional de odontologia deve atuar na equipe oncológica, com o objetivo de prevenir complicações bucais e controlar os efeitos colaterais da radioterapia e quimioterapia. O acompanhamento deve ser feito também na fase aguda, imunossupressão, internação hospitalar e nas etapas de remissão e doença assintomática.
O planejamento do tratamento odontológico do paciente oncológico também é responsabilidade do dentista, portanto, é importante dar foco aos treinamentos de higiene bucal, especialmente quando falamos de crianças, que são dependentes dos pais e possuem menos autonomia e coordenação.
A higiene bucal deve fazer parte dos cuidados oncológicos como meio de prevenção a cáries e doenças periodontais.
Planejar todos os procedimentos odontológicos para garantir a saúde bucal do paciente oncológico é fundamental e deve começar antes da quimioterapia ou radioterapia.
O profissional de odontologia deve a acompanhar o paciente oncológico em todas as etapas, até em situações de internação. Portanto, é preciso continuar a conversar e tirar dúvidas sobre a higiene bucal, prescrever bochechos conforme a necessidade dos pacientes e atuar com os tratamentos corretos, que iremos explicar posteriormente neste texto.
É comum que pacientes oncológicos tenham a saúde bucal prejudicada após passar por diversos tratamentos agressivos. Portanto, é essencial que ele não deixe o acompanhamento com o cirurgião-dentista para cuidar das complicações tardias.
Periodicamente, devem ser feitas avaliações para eliminar placa bacteriana. Também pode ser feita raspagem supra gengival, restaurações definitivas, tratamentos necessários, bochechos e procedimentos com laser de baixa potência.
Para planejar o protocolo de atendimento do paciente oncológico, é importante que o cirurgião-dentista tenha conhecimentos de como a radioterapia e a quimioterapia podem influenciar a saúde bucal.
Como já citamos, o preenchimento da anamnese deve ser feito cuidadosamente com pacientes oncológicos. Portanto, cabe ao cirurgião-dentista também compreender a ligação entre quimioterapia, radioterapia e odontologia.
Comece por entender se o paciente já passou ou ainda passa por uma dessas terapias e se, além delas, foi necessário uma cirurgia.
Conhecer esse histórico é essencial e esclarecedor para que o cirurgião-dentista possa compreender a gravidade do câncer, planejar um tratamento que considere todos os cuidados oncológicos e diagnosticar com mais precisão.
Portanto, vamos compreender melhor como cada terapia interfere na saúde bucal do seu paciente.
Entre as terapias, uma das mais comuns é a quimioterapia. Em resumo, esse procedimento pode ser feito por meio de quimioterápicos que atuam como destruidores das células cancerígenas. Mas há também aqueles que atuam de forma hormonal (comum no câncer de mama) ou que potencializam a radioterapia.
A quimioterapia, além de atingir as células cancerígenas, danifica as normais e, consequentemente, interfere naquelas que ficam situadas na boca. Portanto, esse tratamento pode ter efeitos colaterais na mucosa, nas glândulas salivares, no tecido mole e na gengiva.
Segundo o artigo “Manifestações bucais em pacientes submetidos à quimioterapia”, alguns quadros surgem em decorrência da terapia podem levar a complicações sistêmicas graves e, inclusive, aumentar o tempo de internação hospitalar.
Dica: ao fazer a anamnese, consulte quais os quimioterápicos são utilizados na terapia do paciente. Caso ele não saiba os nomes de todos — o que é bem comum —, entre em contato com o oncologista.
Pacientes que passam pela quimioterapia nem sempre vão ser medicados apenas com um quimioterápico, portanto, é importante ter em mãos o nome de cada um.
A radioterapia também é uma das terapias mais comuns, entretanto, pacientes oncológicos que passam ou passaram por esse procedimento merecem atenção especial.
De acordo com o artigo “Efeitos da radioterapia sobre as condições bucais de pacientes odontológicos”, o procedimento, apesar de proporcionar resultados significativos, pode afetar a qualidade de vida do paciente. Isso dependerá de alguns fatores, como a dose ou a frequência do tratamento, o local irradiado, os tratamentos associados, a idade e as condições clínicas do paciente.
Como efeitos colaterais da radioterapia, temos a mucosite, xerostomia e outras manifestações, que falaremos posteriormente neste texto.
Considerando que o cirurgião-dentista deva acompanhar todas as etapas pelas quais o paciente oncológico passa, é imprescindível que esse profissional conheça quais as complicações orais mais comuns para que possa estar preparado e também criar um planejamento de atendimento mais completo.
As manifestações e complicações começam a acontecer durante o tratamento e, dessa forma, é imprescindível que o cirurgião-dentista faça os procedimentos corretamente. Em seguida, trazemos alguns dos quadros mais comuns no período das terapias.
De acordo com o “Protocolo de atendimento odontológico a pacientes oncológicos pediátricos”, a hemorragia é um dos casos mais previsíveis. Portanto, antes de realizar cirurgias, o dentista deve ter em mãos exames com a contagem de plaquetas.
Caso o número esteja abaixo ou igual a 75.000 plaquetas/mm³, as intervenções devem ser evitadas. Em situações em que é exigida a cirurgia, o cirurgião-dentista deve alinhar a situação com a equipe médica para a administração de uma transfusão de concentrado de plaquetas.
Segundo o artigo “Leucemia no paciente pediátrico: atuação odontológica”, a mucosite se define como “uma alteração na textura e coloração da mucosa, devido à atrofia do epitélio, que pode apresentar-se com sintoma de dor leve a grave, dependendo do grau de perda tecidual e agressão por patógenos”.
Entre as complicações orais, ela é uma das mais dolorosas, além de comum. A mucosite, de acordo com o estudo “Utilização da terapia com laser de baixa potência para prevenção de mucosite oral”, surge em decorrência da quimioterapia de grande dosagem em pacientes que passam pelo transplante de medula óssea e pela exposição à radioterapia na região da cabeça e do pescoço.
Para classificar os níveis da complicação oral, a Organização Mundial da Saúde (OMS) criou uma escala que vai de 0 a 4, em que zero significa que a mucosite não acontece, e quatro corresponde aos casos severos, com lesões intensas e a necessidade de entrar com a alimentação enteral ou parenteral e suspensão do tratamento até que o paciente possa se recuperar.
Para o tratamento da mucosite oral, o “Protocolo de atendimento odontológico a pacientes oncológicos pediátricos” traz algumas recomendações:
Para prevenir essa complicação, o protocolo sugere que, um dia após o término da quimioterapia, sejam feitos bochechos com hidróxido de alumínio 10% cinco vezes ao dia durante sete dias. A laserterapia também é um dos procedimentos que tem trazido resultados satisfatórios.
O paciente oncológico, devido aos efeitos colaterais dos tratamentos, apresenta uma série de manifestações bucais.
Infecção preexistente na cavidade bucal é um dos motivos pelos quais o paciente deve passar por uma avaliação odontológica o quanto antes após o diagnóstico. Em geral, ela pode ser de origem endodôntica ou periodontal, e como consequência, vir a desenvolver uma infecção local ou sistemática.
Infecções podem ser de variados tipos e, portanto, são tratadas de formas diferentes, como podemos verificar:
Após os tratamentos oncológicos, o paciente ainda deve continuar a ser acompanhado pelo cirurgião-dentista, para cuidar de complicações bucais que acontecem posteriormente, como cárie de radiação, xerostomia e outras alterações.
A cárie de radiação surge entre o segundo mês até o primeiro ano após o início do tratamento radioterápico. Ela é do tipo rampante, ou seja, destrói a coroa e expõe a raiz do dente e, como consequência, pode danificar toda a dentição do paciente em apenas alguns meses.
Para o tratamento, é indicada a restauração com ionômero de vidro e bochechos diários de fluoreto de sódio não acidulado a 0,5% durante um minuto.
Este é mais um dos efeitos colaterais da radioterapia e, em casos de pacientes com dentes em mau estado, trauma ósseo, doença periodontal e presença de quimioterapia combinada, as chances de necrose óssea aumentam.
Geralmente, a mandíbula é o osso mais afetado pela ocorrência, que altera os vasos sanguíneos, deixando-a menos irrigada e, portanto, com mais riscos de infecção.
O “Protocolo de atendimento odontológico a pacientes oncológicos pediátricos” sugere que o tratamento seja feito com antibióticos, oxigênio hiperbárico com antibioticoterapia e debridamento local.
A xerostomia é uma das complicações bucais mais comuns em pacientes oncológicos, especialmente naqueles que passaram por radioterapia. Quando essa terapia é sobre as glândulas salivares, a produção de saliva fica afetada e, claro, gera algumas consequências negativas.
Entre elas, podemos citar a mucosa sem proteção, a dificuldade de deglutir o bolo alimentar, o aumento de níveis de desmineralização, a sensação de queimação na boca, a halitose e as alterações na sensibilidade gustativa.
Para tratar as manifestações de xerostomia, o paciente oncológico recebe medidas paliativas, como prevenção de cáries, administração de flúor, uso de sialogogos e aumento na ingestão de água.
Compreender as manifestações de complicações orais, como elas acontecem e como tratá-las, é essencial para oferecer cuidados oncológicos ao paciente e garantir a ele mais conforto durante o processo de tratamentos com antineoplásicos.
Além disso, agir de forma humanizada, respeitando os sentimentos e as condições do paciente oncológico, é imprescindível para uma relação harmoniosa e acolhedora, afinal, o cirurgião-dentista também pode contribuir para o bem-estar mental e emocional.
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MUITO BOA A MATÉRIA.
TENHO O APARELHO LASER COM ILIB DA DMC,E GOSTARIA MUITO DE AUXILIAR EM PACIETES ONCOLÓGICOS,MAS PRECISO DE MAIS TREINAMENTO.
Olá, Márcia! Como vai?
Ficamos felizes que tenha gostado da matéria!
Sem dúvidas, buscar conhecimento para lidar com as especificidades dos pacientes oncológicos é muito importante.
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