Ter uma boa noite de descanso, para a maioria dos adultos, parece uma realidade inalcançável: 66% dos brasileiros afirmam não dormir bem, segundo dados de uma pesquisa. Entre os diversos motivos que fazem desse momento um verdadeiro pesadelo estão os distúrbios de sono, problemas que podem ter desde origem psicológica até respiratória.
O tratamento dos distúrbios, em geral, é feito de forma multidisciplinar e, nessa equipe, o cirurgião-dentista está incluso, com o papel de analisar manifestações que já são bastante conhecidas dentro do consultório odontológico, como o bruxismo.
Para isso, é importante manter-se informado sobre quais são os distúrbios que podem contar com a ajuda da odontologia, como diagnosticá-los e quais tratamentos estão disponíveis. Assim, o profissional conseguirá proporcionar resultados satisfatórios para os pacientes e, até mesmo, destacar-se no mercado. Siga a leitura e saiba mais!
A importância do sono para a qualidade de vida
Antes de passarmos pelos distúrbios, vamos bater um rápido papo sobre a importância do sono e como isso interfere na qualidade de vida dos pacientes.
Dormir é uma função biológica imprescindível para o nosso funcionamento, uma vez que é responsável pela consolidação da memória, pelo fortalecimento do sistema imunológico, pela termorregulação, conservação e restauração da energia, pelo descanso muscular, pela restauração do metabolismo energético cerebral, pelo aprendizado, entre outras.
A falta de uma boa noite de sono pode gerar diversas consequências na vida do indivíduo, como maiores riscos de acidentes de trânsito, depressão, baixo rendimento nas tarefas diárias, estilo de vida estressante, doenças físicas e, até mesmo, abuso de álcool e outras drogas. Esses são apenas alguns exemplos de uma grande lista de situações negativas que podem surgir na rotina de quem não dorme bem.
Como funciona o sono?
Compreender como funciona o momento de dormir também é algo que dentistas devem saber, sobretudo se querem atuar na área da odontologia do sono. Afinal, algumas manifestações que explicaremos acontecem em etapas específicas, como o bruxismo, que ocorre durante o estágio 2 do sono leve ou durante a troca das fases.
O momento de dormir pode ser dividido em até cinco estágios, que estão relacionados a cada fase do sono — e que duram, em média, de 60 a 90 minutos cada uma. Para compreender de forma mais simples, indicamos o vídeo do canal Saúde em Mente, que explica cada etapa.
Qual o papel da odontologia na medicina do sono?
Justamente por interferir em tantos aspectos da saúde, o sono também se relaciona com diversos ramos de atuação, como a odontologia. É o dentista que tem contato direto com a boca do paciente, área do corpo ligada às vias áreas que, por conseguinte, conecta-se com distúrbios do sono, como a síndrome da apneia obstrutiva do sono.
O dentista, portanto, pode contribuir muito em relação à avaliação clínica e na execução de terapias que estejam de acordo com a necessidade do paciente.
Distúrbios do sono
Distúrbio do sono é um conceito genérico para abranger um grande leque de manifestações que ocorrem durante a hora de dormir e que prejudicam esse momento, gerando consequências para o dia a dia do paciente. Alguns exemplos são insônias, parassonias e distúrbios respiratórios do sono — este último está relacionado com a odontologia, como veremos.
Atualmente, pesquisadores da área entendem que diversos fatores podem contribuir para o surgimento de distúrbios de sono, como doenças metabólicas e cardiovasculares, tabagismo, sobrepeso e obesidade, assim como hábitos, estilo de vida e fatores externos.
Quando puxamos para odontologia, os distúrbios de sono que chamam a atenção são: bruxismo, ronco e distúrbios respiratórios do sono, que incluem os três tipos de apneia — obstrutiva, central e mista. Em seguida, vamos compreender melhor cada uma dessas manifestações.
Bruxismo do sono
O bruxismo é uma das parafunções orais bastante conhecidas dentro do consultório, e já se sabe que é caracterizado por atividade diurna e/ou noturna.
Focaremos no bruxismo do sono, que pode ser caracterizado por movimentos estereotipados, como ranger, bater ou apertar os dentes. Geralmente, são associados à fisiologia do sono, como explica o artigo “Avaliação dos fatores de risco do bruxismo do sono”. Recentemente, passou a ser classificado como um transtorno do movimento relacionado ao sono.
O que opõe o bruxismo do sono ao diurno? Informações do artigo “Bruxismo do sono” apontam distintos estados de consciência (sono de vigília) e diferentes estados fisiológicos com influências na excitabilidade oral motora.
Enquanto o bruxismo diurno realiza atividade semivoluntária, ou seja, pode estar relacionado a uma mania da pessoa enquanto está acordada, o noturno é totalmente inconsciente.
Segundo dados do trabalho “Avaliação dos fatores de risco do bruxismo do sono”, é difícil ter números concretos da porcentagem de pessoas com bruxismo noturno, justamente por ser uma condição involuntária e inconsciente, mas estima-se que 18,8% dos adultos e 35,3% das crianças tenham.
Etiologia
Ainda são realizados diversos estudos em relação ao assunto, mas já é de conhecimento geral que as causas podem ser relacionadas ao emocional/psicológico, ambiente de dormir, doenças de vias aéreas superiores, ingestão de álcool, cafeína e cigarro, medicamentos específicos e atividades involuntárias rítmicas da musculatura mastigatória, conforme explica o artigo “Avaliação dos fatores de risco do bruxismo do sono”
Sintomas
Em geral, os pacientes com bruxismo de sono apontam:
- Dor de cabeça na região temporal
- Travamento ou dificuldade de abertura bucal e hipersensibilidade dentária
- Musculatura mandibular rígida ou fadigada
Clinicamente, é possível perceber desgaste dentário, hipertrofia muscular na região de masseter, língua edentada, desgaste dentário incompatível com a idade, abfração e fraturas de restaurações ou dentes, como informa o artigo “Avaliação dos fatores de risco do bruxismo do sono”.
Diagnóstico
Um dos pontos que indicam o bruxismo são os relatos do próprio paciente que, em geral, reclama de dor ou tensão nos músculos da face ao acordar, assim como o ranger dos dentes — que pode ser percebido pelo companheiro/a.
O dentista também deve analisar os dentes e notar se há desgaste anormal e hipertrofia do masseter. Mas lembre-se: esses dois aspectos não são, por si só, definidores. É preciso investigar mais.
Polissonografia é uma grande aliada no diagnóstico. Infelizmente, nem sempre é possível contar com essa técnica, mas, se estiver ao seu alcance, vale a pena utilizá-la.
Tratamento
Existem diversas alternativas para o tratamento de bruxismo, que em geral, pode ser feito de forma multidisciplinar, com a ajuda de fármacos, psicoterapia e, claro, da odontologia.
O artigo “Bruxismo do sono” explica que o uso de remédios deve ser feito em casos mais graves e agudos, por um curto período de tempo.
Já o psicólogo será essencial para auxiliar o paciente com mudanças de hábitos focadas na higiene do sono, técnicas de relaxamento, controle do estresse, entre outras terapias que o profissional julgar necessárias para o caso do indivíduo.
Na odontologia, são feitos ajuste oclusal, tratamento ortodôntico e restaurações dentárias. Também é recomendado o uso de placas para bruxismo.
Apneia obstrutiva do sono (Saos)
Mais comum entre o gênero masculino, e agravada com a idade e o aumento de peso, a Saos é um distúrbio crônico, progressivo, incapacitante e com consequências sistêmicas graves. Entre os tipos de apneia, que comentamos anteriormente, ela se categoriza na central e é a mais comum — por isso, focaremos nela.
Segundo o artigo “A odontologia na síndrome da apneia obstrutiva do sono”, a Saos ocorre durante o sono e como consequência do posicionamento posterior da língua, que pode fazer com que aconteça a redução substancial (hipopneia) ou a cessão completa (apneia) do fluxo de ar para os pulmões, durante um período de 10 segundos, mesmo havendo esforços respiratórios.
Quando isso ocorre, a pessoa continua a tentar respirar, até que passa para a hipoxemia (baixo nível de oxigênio no sangue) e, nesse estado, o indivíduo acorda. Esse ato de despertar faz com que sejam desobstruídas as vias aéreas superiores (VAS).
Etiologia
Assim como o bruxismo, a Soas também é multifatorial. Um dos motivos que contribui para o surgimento do distúrbio são alterações anatômicas nas vias aéreas superiores e no esqueleto craniofacial associadas a alterações neuromusculares da faringe.
Além disso, outros fatores contribuem, como obesidade, aumento do tecido linfoide da faringe, obstrução nasal, anormalidades craniofaciais e endócrinas e histórico familiar, de acordo com o trabalho “A odontologia na síndrome da apneia obstrutiva do sono”.
Sintomas
É muito comum que esses pacientes relatem os seguintes episódios:
- Ronco alternado por momentos de silêncio
- Sonolência diurna excessiva
- Movimentação noturna
- Comportamento anormal enquanto dorme
- Respiração pela boca
- Disfunção sexual
- Irritabilidade
- Depressão e ansiedade
- Sensação de sufocamento ao acordar
- Privação de sono
Diagnóstico
Ao receber o paciente no consultório, você pode começar o diagnóstico pela anamnese. Como podemos ver no tópico anterior, alguns indícios serão coletados com a ajuda do indivíduo, ao relatar melhor como é a relação dele com o sono. Portanto, não deixe escapar as seguintes perguntas:
- O parceiro/parceira relata períodos de ronco e silêncio?
- Sente-se cansado com frequência?
- Há alterações sistêmicas? Diabetes, hipotireodismo etc.
Além dessa etapa, exames físicos e imagiológicos são importantes e, se possível, a polissonografia.
Tratamento
Segundo o artigo “Apneia obstrutiva do sono: diagnóstico e tratamento”, é importante contar com uma equipe multidisciplinar para atender o paciente em todas as necessidades.
Na parte da odontologia, o artigo aponta o uso de aparelhos intrabucais para casos leves e moderados, já que há relatos de bons resultados para esses grupos de pacientes. Lembre-se que, para essa opção, é necessário que o indivíduo tenha, no mínimo, dez dentes.
Outra alternativa é o uso de aparelhos Continuous Positive Airway Pressure (Cpap) e Bilevel Positive Pressure Airway (Bipap), que injetam ar comprimido. Essa terapia é indicada a curto prazo para pacientes com quadro leve a moderado.
Para os casos de moderado a severo, há a opção da uvulopalatofaringoplastia, que alarga o espaço aéreo faríngeo.
Compreender as especificidades de cada distúrbio é essencial para estudar a fundo o caso de cada paciente e, de forma multidisciplinar, propor soluções eficazes e que possam melhorar a qualidade de vida do indivíduo.
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