Já imaginou atuar além do consultório e das especialidades tradicionais? Cirurgiões-dentistas podem ocupar outros espaços, fora das clínicas, e uma dessas formas é graças à odontologia forense, ramo em ascensão e que tem sido reconhecido por ser crucial no reconhecimento de vítimas de tragédias ou crimes.
A especialidade permite que a identificação seja feita por meio da análise de registros odontológicos, de mordidas e com auxílio do estudo de arcadas dentárias. Além disso, a área tem outras atuações que contribuem no campo acadêmico e, consequentemente, para outros ramos da odontologia.
Continue a leitura para conhecer mais sobre a área, entender quais as funções do especialista em odontologia forense e como se tornar um dentista legal!
O que é odontologia forense?
A odontologia forense, também conhecida como odontologia legal, é uma especialidade da odontologia que estuda processos físicos, químicos, biológicos e psíquicos. “[Os fenômenos] podem atingir ou ter atingido o homem vivo, morto ou ossada, e mesmo fragmentos ou vestígios, resultando lesões parciais ou totais reversíveis, ou irreversíveis”, afirma o Conselho Federal de Odontologia (CFO).
Uma das primeiras ideias sobre a especialidade é de que a atuação tem como foco apenas a esfera criminal. No entanto, ela abrange perícias trabalhistas, administrativas, auditorias em planos odontológicos, fiscalização em conselhos, assim como docência em universidades, especializações e cursos de imersão.
A rotina na odontologia legal necessita, ainda, de diversos conhecimentos adquiridos ao longo da graduação — radiologia, odontopediatria, ortodontia, entre outros — para que as perícias possam ser realizadas.
Como a odontologia forense surgiu?
O primeiro relato sobre a atuação na área foi em Paris, em 1897, após incêndio em um bazar onde aconteciam leilões beneficentes muito frequentados pela burguesia e nobres franceses. O ocorrido resultou em 200 mortos e, entre eles, 40 ficaram sem identificação.
Perante esse episódio, o cônsul Albert Hans sugeriu a comparação entre a arcada dentária das vítimas e os tratamentos odontológicos documentados pelos cirurgiões-dentistas que atendiam às classes mais altas de Paris. Mesmo naquela época, o resultado das identificações foi de 90%.
Competências na odontologia forense
Atuar na área de odontologia legal exige que os cirurgiões-dentistas dominem competências específicas, que podem ser adquiridas durante a graduação, em pós-graduações stricto (mestrado ou doutorado) ou lato sensu (MBAs e especializações) e cursos de aperfeiçoamento.
Segundo a Resolução 63/2005, do CFO, ao odontolegista cabem as seguintes aptidões:
- Identificação humana;
- Perícia em área administrativa;
- Perícia em foro civil, criminal e trabalhista;
- Perícia, avaliação e planejamento em infortunística;
- Tanatologia forense;
- Traumatologia odonto-legal;
- Perícia logística no vivo e no morto, íntegro ou em partes em fragmento;
- Perícia em manchas ou líquidos provenientes da cavidade bucal;
- Elaboração de laudos, atos, pareceres, relatórios e atestados;
- Exames por imagem para fins periciais e odonto-legais;
- Deontologia odontológica;
- Orientação odonto-legal para atuar profissionalmente.
Atuação do odontolegista
De acordo com a resolução do CFO, os dentistas legais atuam apenas na análise, perícia e avaliação de eventos, associados à competência da odontologia em geral. No entanto, pode ser que sejam incluídas outras circunstâncias, como interesses jurídicos.
Na sequência, veja detalhes sobre as principais áreas de atuação na odontologia forense!
Perícia criminal
A perícia criminal é uma das primeiras áreas que pensamos quando o assunto é a odontologia legal. O segmento se tornou conhecido por conta de filmes, séries e notícias sobre o setor. Nesta atuação, o odontolegista tem um papel de auxiliar da justiça, contribuindo para investigação após a realização de exames técnicos.
Dessa forma, o profissional precisa ter conhecimentos bem específicos, uma vez que um laudo pode ser suficiente para trazer respostas relevantes ao caso, como identificação de vítimas.
Segundo o artigo “O papel do odontologista nas perícias criminais”, a perícia criminal ocorre da seguinte forma:
- Identificação no vivo (quando é necessário provar a idade de um criminoso, marcas de mordidas, etc).
- Identificação no cadáver (corpos carbonizados, dilacerados, estado avançado de putrefação, afogados, acidentes de massa).
- Identificações antropológicas (para verificar espécie, sexo, idade, estrutura biológica por meio da análise do crânio esqueletizado).
- Lesões corporais ou perícias de traumatologia.
- Perícia de mancha.
- Exame de embriaguez.
Já o artigo “A importância do odontologista dentro do Instituto Médico Legal” explica que, atualmente, ainda existem poucos IMLs que contam com a presença de um cirurgião-dentista.
Entretanto, a atuação do profissional é necessária já que, na ausência dele, médicos precisam ultrapassar os limites da formação específica e, infelizmente, podem não saber identificar determinadas lesões intra e extrabucais.
Perícias trabalhistas
No âmbito trabalhista, a perícia não foca apenas no trabalhador, como também no próprio ambiente de trabalho. A atuação odontológica neste caso está regulamentada pela Resolução 22/2001 do CFO e ratificada pela Resolução 116/2012.
O documento afirma que a especialidade tem o propósito de buscar, constantemente, preservar a saúde bucal do trabalhador alinhado ao ambiente laboral.
Dentro de diferentes tipos de ambientes de trabalho, é possível que colaboradores passem por acidentes. A partir desse cenário, a odontologia legal entra com o objetivo de relacionar a causa com a lesão.
Para isso, é preciso uma série de pesquisas e processos, como o conhecimento do histórico do paciente, estudo do local, ocorrência do quadro e outros aspectos.
Auditoria odontológica
Especialistas em odontologia forense também podem apostar no ramo de auditoria. Cada vez mais, prestadores de serviços, como planos odontológicos, buscam por um profissional capacitado para realizar essa função.
O CFO, por meio da Resolução 20/2001, normatiza a perícia em auditoria considerando a necessidade de padronizar fiscalizações, melhorar e garantir atendimento digno aos pacientes e, dessa forma, manter a ética da profissão.
A atuação consiste na verificação da execução e da qualidade técnico-científica dos procedimentos realizados por credenciados aos planos odontológicos ou cooperativas.
O profissional pode ser concursado ou contratado por empresa pública ou privada, e aplicar medidas técnicas e administrativas que corrijam cobranças de procedimentos odontológicos indevidos, avaliando com exatidão valores e serviços apresentados para o pagamento.
Além disso, cabe ao perito realizar auditorias prévias e finais, para verificar se o plano de tratamento proposto inicialmente foi realizado e alcançado.
Como se tornar um dentista legal?
Para ser um odontolegista, é preciso se especializar por meio de cursos de pós-graduação disponíveis em universidades e instituições públicas e privadas. Normalmente, a duração varia de 8 a 15 meses a depender da entidade.
Em geral, os conteúdos lecionados são perícias em área cível, criminal e trabalhista e administrativas; criação e interpretação de laudos periciais; aplicação de diferentes especialidades na odontologia legal; deontologia odontológica; perícia no vivo, no morto, íntegro ou em suas partes em fragmentos; ética e legislação odontológica e outras matérias, de acordo com a instituição.
Ética na odontologia forense
A ética na odontologia forense é primordial para que o trabalho do cirurgião-dentista, no âmbito da justiça, seja realizado com qualidade e confiabilidade.
Nesse sentido, o CFO é responsável por regulamentar a ética dos profissionais da odontologia e editar os códigos que devem ser seguidos.
No caso do cirurgião-dentista que atua como perito, é preciso seguir as recomendações e padrões éticos estabelecidos pelo órgão, que incluem:
- Manter a privacidade do paciente;
- Zelar pela integridade dos acervos odontológicos;
- Obedecer aos códigos de ética e conduta;
- Prestar informações corretas e claras sobre as técnicas utilizadas;
- Garantir a confiabilidade e a competência do trabalho realizado;
- Só aceitar encargos para os quais esteja capacitado;
- Não aceitar remuneração ou vantagem de terceiros que possam influenciar no trabalho pericial.
Se você se interessa por direito e gostaria de trabalhar aliado à justiça, tem preferência por cargos concursados e prefere atuar fora da clínica, a odontologia forense pode ser o rumo que a sua carreira precisa!
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Referências bibliográficas
Conselho Federal de Odontologia. Resolução CFO-185/93, de 26 de abril de 1993. Disponível em: http://www.forp.usp.br/ restauradora/etica/rcfo185_93.
SILVEIRA, Emanuela. Odontologia legal: conceito, origem, aplicações e história da perícia. Saúde, Ética e Justiça, São Paulo, n. 13, v.1, p.33-36, 2008. Disponível em: https://www.revistas.usp.br/sej/article/download/44560/48180.